A Cidade do Turismo
Trinidad é uma espécie de Disneylândia do turismo cubano. Não tem mikeys nem margaridas ou plutos. Têm uma cidade pequena e encapsulada nos tempos coloniais castelhanos.
Na ausência dos bonecos do tio Walt, Cuba tem sempre Hemingway, onde se sentou, onde bebeu um daikiri, onde fumou um puro…
O bar em questão chama-se Floridita, mas fica em Havana. Nenhum problema porque crescem cópias como cogumelos e em Trinidad até tem uma estatueta em bronze para poder tirar fotos com o famoso escritor. E os daikiris são soberbos.
Já tinha passado pelo mesmo em Pamplona, no Café Iruna da Plaza Castillo, mas sem as largadas de touros de S. Fermin.
Regressando a Cuba, não faltam atrativos para visitar Trinidad, além dos daikiris. Edifícios bem preservados, o que não é muito frequente em Cuba, nem sequer em Havana, em ruas pavimentadas em empedrado irregular e que não facilitam a passada.
Uma das atrações de Trinidad não é Trinidad mas a fabulosa Playa Ancón, com autocarro de hora a hora e de pagamento em cartão, 2 dólares ida e volta, numa viagem de meia hora com paisagens interessantes. Mas já lá vamos.
As ruas de Trinidad são uma festa para os turistas, carregadas de lojas com tudo o que um turista pode desejar trazer de Cuba: estatuetas, charutos de origens suspeitas e qualidade duvidosa, garrafas de rum, roupa tradicional, como guayaberas, as camisas dos trabalhadores agrícolas e da revolução.
Como não podia deixar de ser num local tão turístico, existem vários museus que celebram, para os visitantes verem e os locais recordarem, desde a luta contra os bandidos (!), o romantismo ou a santeria.
Uma palavra sobre a santeria, um culto do povo Iorubá, mas muito cruzada com o cristianismo e outras crenças, não só da África original mas com diversas culturas sul americanas e com nuances próprias de cada país ou região.
Em Cuba a santeria é muito presente e os seus praticantes são facilmente identificáveis pelas suas vestes imaculadamente branca.
Trinidad é, assim, o resultado dessa miscigenação, proporcionada pelas vastas plantações de açúcar, os escravos que as trabalhavam e a arquitetura que tudo e todos abrigava.
O açúcar foi importante ainda durante a relação de extrema proximidade com a União Soviética, mas deixou de o ser. Hoje a sua importância reflete-se apenas no rum, mas cuja produção não é exclusivamente cubana.
A todo o momento chegam autocarros que despejam turistas nas suas ruas. Turistas que ao fim da tarde se reúnem nas escadarias junto à Casa de La Musica, imunes aos mosquitos e comendo hambúrgueres ao som das rumbas, salsas, sons e por aí fora. Não faltam ritmos em Cuba.
Esta escadaria fica à direita da maior igreja da cidade, atribuída à Santíssima Trindade, como seria de esperar, protetora da cidade.
Por sua vez, aos pés desta igreja fica a Plaza Mayor que, para quem vá pelo nome ou por experiências anteriores, só tem que se preparar para uma desilusão: não é pequena. É minúscula! Tem um jardinzinho raquítico e atarrachado por muita soalheira que o torna mais castanho que verde.
No entanto, o alpendre da igreja, fresco e sombrio, seria o local ideal para se ficar pela contemplação dos arredores, da energia do cubanos para obter alguns dólares. Seria, se as nervuras da sua abóboda não fosse também o local preferido dos pombos, provado que ficou o mal intestinal das pobres aves, talvez originado pelos hambúrgueres. Já vi chover com menos intensidade, e isso é uma verdade insofismável.
Vítimas desse bombardeio implacável, que só por muita arte não nos atingiu, lá fomos obrigados a deambular pelas ruas da cidade e vasculhar nas lojas sempre repletas de simpatia.
Uma delas chamou a nossa atenção: era um posto de correios, com postais ilustrados e tudo! Perguntámos à funcionária quanto tempo demorariam os postais a chegar a Portugal. “Onde?” inquiriu, lá explicámos o que era e onde era e após uns segundos responde: “cerca de 3 meses”. Ainda tentamos precisar se, por exemplo para Espanha ou França seria menos tempo. “Não, é igual”.
Havia muito a perguntar, mas tememos pela nossa sanidade, agredida por outras realidades. Comprámos os postais, mas trouxemo-los connosco: chegariam muito mais rápido!
Numa coisa Trinidad é exemplar: o fim que deram aos canhões. Enterrados de boca no chão, não correm o risco de voltar a disparar, mas impedem o trânsito, ou protegem as esquinas. Que mais pode um canhão desejar em tempo de paz?
As refeições não foram fáceis em Trinidad, à exceção do pequeno-almoço servido na casa onde ficámos, que era saboroso e substancial. Sumo da fruta que havia no dia, ovos, pão (nem imagino como é que a dona da casa o conseguia), fruta descascada e cortada em pedaços e, claro, excelente café.
Saíamos depois em busca do café expresso mais próximo que acontecia ser logo ali, num hotel de muitas estrelas da cadeia Iberostar, Grand Trinidad de seu nome próprio, situado na Plaza Carillo.
Não sei se foi das estrelas que atrapalharam a qualidade, mas o café parecia-se bastante com a porcaria dos pombos e quando almoçámos em busca de uma boa e reconfortante refeição, afinal, colocaram-nos na mesa a segunda pior refeição de toda a ilha cubana.
A pior, mesmo pior, foi em Camagüey, uma perna de frango quem, de tão congelado, não permitia o garfo de cumprir a sua função. Da faca nem falo.
No entanto, não faltam bons restaurantes em Trinidad. Uns melhores e caros, outros melhores, informais e mais acessíveis.
Curiosamente, com a sua proximidade ao mar, o prato de refúgio era a lagosta. Não era mais cara e normalmente sempre saborosa.
Também para nós, a proximidade do mar e especialmente da praia, constituía um convite irrecusável e lá fomos apanhar o autocarro para a Playa Ancón…
A praia tinha tudo o que podíamos esperar duma praia, incluindo vários hotéis. O primeiro, logo no terminal do autocarro, era do estado. Numa paragem anterior, num grande empreendimento, era também do estado. Será que o autocarro só parava em hotéis do estado?
Pois, boa pergunta.
Lá procurámos uma sombra para nos deitar e fazer a praia que gozamos sempre e onde pudermos e assim foi, com catamarans para alugar e alguns vendedores que nos abordavam para vender mangas ou chapéus de palha.
Foi Ambrosio, um dos vendedores mais idosos que se sentou à nossa beira e nos foi pondo a par das novidades.
Desde logo nos informou que o hotel tinha sido construído por um italiano. Esse homem, cujo nome Ambrosio já esquecera ou desejava omitir, de forma a construir a unidade hoteleira teve de construir primeiro uma fábrica de betão.
Começou a construção e começaram as invejas, os papéis, certidões e permissões que pareciam nascer uma de dentro da outra, num parto incessante, qual boneca russa.
Do italiano já não reza a história. Teve sorte em poder partir confessa Ambrosio, e desandou antes que falasse ainda demais. Não faço a menor ideia, sequer, se existiu ou se foi apenas uma lenda para saborear à beira mar, olhando as ondinhas beijarem a areia. Não faz qualquer diferença.
Regressou o vendedor de mangas, reforçando a sua aproximação comercial, explicando que aquelas mangas tinham vindo da montanha, não eram das locais: “maravilhosas” afiançava.
Mas não nos convenceu.
Como era dos primeiros dias de praia não torrámos ao sol, o que seria de enorme imprudência, que o sol do Caribe não é para brincadeira.
Mais vale ir comer uma lagosta… E lá fomos
Viajar pelos trópicos é sempre agradável. A paisagem, o calor, o mar e a simpatia dos povos incendeiam a imaginação e despertam, no leitor, aquele desejo incontrolável de beber um daikiri, comer lagosta, ouvir uma rumba e fumar um puro autêntico.